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26 de Abril de 2024

Não averbar a reserva legal: Desapropriação?

Tema controvertido e que coloca o produtor rural como verdadeiro vilão perante a sociedade é a questão da Reforma Agrária. Boa parte da população está habituada a colocar os ruralistas em contraposição aos ambientalistas sem, contudo, ponderar questões de extrema relevância, como a cadeia alimentícia e de produção, os direitos de propriedade e o histórico geopolítico do Brasil.

Da mesma forma, a questão da atuação dos órgãos públicos na operacionalização da reforma agrária é tema que ocupa pouco espaço na pauta de discussões.

Muito se tem falado sobre a inclusão do CAR - Cadastro Ambiental Rural - como a nova ferramenta de controle das reservas ambientais e recuperação de áreas ambientais dentro de propriedades rurais, mas a prorrogação do prazo para cadastramento no sistema em questão impõe a análise do controle que atualmente vem sendo feito pela autarquia responsável – o INCRA.

Isto quer dizer que, apesar de ainda não ser obrigatório o registro do CAR, a propriedade rural permanece obrigada a cumprir a legislação ambiental, em especial o Código Florestal, quanto à proteção ambiental mínima, a chamada reserva legal.

Mas e se o proprietário tiver a reserva legal em sua propriedade, apesar de ainda não ter efetuado o registro no CAR? Ele pode sofrer alguma sanção?

Teoricamente o proprietário rural ainda não está obrigado a promover o cadastro, mas ainda estaria obrigado a dar publicidade ao ato de proteção ambiental da reserva legal mediante a averbação da área protegida às margens da matrícula do imóvel junto ao RGI. Ainda assim, na hipótese de não ter efetuado essa averbação, o entendimento mais adequado a ser adotado seria o de adotar uma punição mais branda do que a adotada pelo INCRA.

Isso porque, ao invés de aplicar multa pelo descumprimento da obrigação de averbar a reserva legal, o INCRA vem adotando entendimento no sentido de que a reserva legal não averbada não pode ser considerada como existente para fins de cálculo da produtividade do imóvel, o “GUT” – Grau de Utilização da Terra.

Lamentavelmente, esse entendimento do INCRA, sedimentado por meio da Nota Técnica Conjunta/INCRA/DT/DO/PFE nº 01/2006, é reverenciado pela maioria dos Tribunais Brasileiros, inclusive pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, responsável pelo julgamento de demandas judiciais nos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.

Referido documento revela que a Autarquia Federal – INCRA – “padronizou” a instrução de seus processos administrativos com base em ementário de acórdão proferido em Mandado de Segurança, determinando, a partir de então, que no decorrer do processo administrativo “somente poderá ser considerada como área de Reserva Legal aquela que estiver, antecipadamente à data da notificação, averbada junto ao registro imobiliário competente, de forma individualizada”.

Andou mal o INCRA ao adotar esse entendimento, na medida em que tanto o atual Código Florestal, quanto a legislação anterior, deixam claro que a Reserva Legal definida pelas leis tem por objetivo a proteção ambiental, tratando-se de uma limitação administrativa, cuja averbação na matrícula é essencial para a atividade de manejo, mas não para fins de cálculo administrativo de produtividade.

O INCRA, como autarquia federal que é, não pode deixar de lado os princípios que regem a administração pública, dentre eles a obrigação que ela tem de buscar sempre a verdade material. É claro, portanto, que a autarquia, ao adotar a Nota Técnica em questão, está ferindo esse princípio, deixando de avaliar a propriedade como verdadeiramente se apresenta.

Também não se poderia deixar de considerar que a sanção pelo descumprimento da observação da legislação de proteção ao meio ambiente encontra-se regulamentada pelo Decreto nº 6.515 de 22 de Julho de 2008 que, dispondo sobre as infrações ambientais, prevê que a ausência de averbação da Reserva legal na matrícula do imóvel é infração ambiental punida com multa de R$ 50,00 (cinquenta reais) a R$ 500,00 (quinhentos reais) por hectare ou fração da área de reserva legal.

A imposição da referida multa encontra baliza no princípio da razoabilidade/proporcionalidade, que, por sua vez é traduzida pelo atendimento simultâneo dos subprincípios da adequação (ou idoneidade), necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Assim, na medida em que a obrigação da publicidade da Reserva Legal é imposição que visa viabilizar a fiscalização ambiental pelos órgãos responsáveis, o seu não cumprimento enseja a imposição de multa que varia de acordo com a extensão da Reserva Legal não averbada.

A desapropriação de imóvel que possui a Reserva Legal, porém não averbada, é medida arbitrária, nada razoável, decorrente de entendimento sedimentado em sede de Mandado de Segurança (modalidade de ação judicial que não permite a produção de provas), que jamais poderia ser transportada para a Administração Pública que tem a obrigação de produzir provas por meio de laudos e pareceres técnicos elaborados por engenheiros pagos pelos cidadãos com o dinheiro público.

Apesar de toda a exposição até aqui feita, vigora o bom e velho ditado de que é melhor prevenir do que remediar. Por isso, apesar de ainda não ser obrigatório o registro dos imóveis no CAR, a orientação para que os proprietários o façam é medida protetiva destes, antes mesmo de ser protetiva ao meio ambiente."

(Moretz-Sohn & Sidi Advogados Associados)

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